TJDFT CONDENA DEPUTADO DISTRITAL A INDENIZAR CASAL HOMOAFETIVO POR POSTAGEM DISCRIMINATÓRIA

A 7ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios condenou o deputado distrital João Hermeto a indenizar um casal por postar mensagem em rede social de cunho homofóbico.


Entenda o caso:

Em sede de processo de n° 0737178-98.2022.8.07.0001, a inicial trouxe que, em 11 de janeiro de 2020, durante formatura dos soldados da Polícia Militar do Distrito Federal, a autora pousou para fotografia com sua companheira e demonstraram afeto por meio de um beijo.

A fotografia foi amplamente divulgada e, em razão disso, o deputado publicou a foto em um grupo de WhatsApp com a seguinte legenda: “Minha corporação tá se acabando. Meu Deus!!! São formandos de hoje. Na minha época, era expulso por pederastia”.

Diante disso, a autora ajuizou a ação pleiteando indenização por danos morais e a publicação de um pedido de desculpas à autora e toda à comunidade LGBTQI+ na rede social de maior visibilidade do réu.

Em sua defesa, o deputado argumentou que “estava no estrito exercício de seu direito fundamental à livre manifestação do pensamento” e que “o local seria inadequado para a prática do beijo”.

Na decisão, a Juíza entendeu que apesar de a liberdade de expressão ser a regra, o seu exercício abusivo implica a análise de responsabilidade civil.

A Magistrada ainda ressaltou:

Ora, é evidente que o conteúdo da mensagem do réu é ofensivo e apto a expor
a autora, pois ultraja diretamente a sua imagem e dos demais casais
homoafetivos, atingindo sua honra subjetiva.
A dignidade humana é direito de caráter constitucional intrínseco à
personalidade humana e passível de reparação por danos. Desta forma, o
direito dá guarida à pretensão da requerente, especialmente ante a patente
violação à sua honra objetiva e subjetiva, ou seja, à imagem do requerente
perante a coletividade e sua própria percepção pessoal. Nesse sentido,
destaco os seguintes julgados deste E.TJDFT:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
OFENSAS PROFERIDAS EM GRUPO FORMADO NO APLICATIVO
WHATSAPP. MENSAGENS PEJORATIVAS E DE BAIXO CALÃO QUE
ATINGIRAM A HONRA DO AUTOR. INDENIZAÇÃO. QUANTUM
INDENIZATÓRIO. MANUTENÇÃO. VALOR PROPORCIONAL.

  1. A inviolabilidade do direito à honra foi elevada constitucionalmente à
    esfera de direito fundamental, prevista no artigo 5º, inc. X, da
    Constituição Federal. Em verdade, essa previsão representa verdadeiro
    corolário da proteção da personalidade e da intimidade do indivíduo,
    razão pela qual deve ser assegurada a reparação moral na hipótese de
    sua violação.
  2. É claramente ofensiva à honra e à imagem mensagens proferidas
    por meio de grupo específico criado no aplicativo de mensagem
    instantânea WhatsApp, com o proferimento de mensagens
    pejorativas e de baixo calão direcionadas à pessoa do autor.
  3. Ainda que as mensagens tenham sido proferidas em um ambiente
    restrito como o grupo de mensagens, se o conteúdo se mostrar
    ultrajante, é cabível a indenização por danos morais. (…)
    (Acórdão n.1038812, 20150710192918APC, Relator: ALVARO CIARLINI
    3ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 09/08/2017, Publicado no DJE:
    23/08/2017. Pág.: 282/288) – destaquei
    APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL.
    DANOS MORAIS. OFENSAS EM REDE SOCIAIS. IMAGEM
    PROFISSIONAL PREJUDICADA. ROMPIMENTO DE CONTRATO DE
    TRABALHO. 1. As ofensas feitas pelo réu em diversas redes sociais
    contra o autor, inclusive mandando mensagem para eventuais
    contratantes de seu serviço, prejudicando sua imagem profissional e
    rompendo contrato de trabalho, geram dano extrapatrimonial passível de
    indenização, mantida em R$ 12.000,00 2. Negou-se provimento ao
    apelo. (Acórdão 1347882, 07032243620198070011, Relator: SÉRGIO
    ROCHA, 4ª Turma Cível, data de julgamento: 10/6/2021, publicado no
    DJE: 24/6/2021. Pág.:  Sem Página Cadastrada.)
    Ressalte-se que na foto não há qualquer tipo de ato sexual ou inoportuno para
    o evento ou para a corporação militar, na medida que trata-se apenas um beijo
    (selinho), que se fosse registrado entre casais heteroafetivos possivelmente
    não causaria tamanha comoção no réu, evidenciando, assim, a conduta
    discriminatória e homofóbica apontada.
    O comentário do réu fora publicado em grupo do WhatsApp composto por
    Policiais Militares do DF, corporação à qual a autora está vinculada, o que
    afasta a tese de que a manifestação se deu em grupo em que a autora não
    pudesse ser identificada ou que as repercussões não lhe fossem alcançar.
     Em resumo, o direito de livre manifestação do pensamento pelo réu, esbarra
    no direito da autora de ter a sua honra resguardada. O comentário homofóbico
    configura a ilicitude, pois ofende direito igualmente previsto na Constituição
    Federal: o dever de não-discriminação pela orientação sexual.


Assim, além da indenização a título de danos morais no valor de R$ 8 mil, o político deverá retratar-se no mesmo grupo de WhatsApp em que publicou a ofensa ou em sua rede social de maior visibilidade, sob pena de multa.

A decisão ainda cabe recurso.

Importante destacar que, em 2019, o Supremo Tribunal Federal julgou a Ação Direta
de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26 (relatoria Min. Celso de Mello) e o Mandado de Injunção 4.733 (relatoria Min. Edson Fachin) para reconhecer a mora do Congresso Nacional para incriminar atos atentatórios a direitos fundamentais dos integrantes da comunidade LGBTQIA+.

Foi julgado procedente o pedido para, entre outros, dar interpretação conforme a
Constituição, para enquadrar a homofobia e a transfobia, qualquer que seja a forma de sua manifestação, nos diversos tipos penais da Lei 7.716/1989
, até que sobrevenha legislação autônoma editada pelo Congresso.

No entanto, até a presente data, o Congresso Nacional não legislou sobre o tema. Essa proteção da população LGBTQI+ decorre de um entendimento da Suprema Corte, que flexibilizou o princípio da legalidade, tendo em vista que nenhum princípio é absoluto, com respeito à irretroatividade da lei penal.

Escrito por Eduardo Bontempo (OAB/DF 58.017). Fonte da pesquisa: TJDFT.

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