O Tribunal Superior de Trabalho – TST, em recente julgamento, em dezembro/2023, reconheceu o assédio e a violência sexual praticados fora do local de trabalho, por um supervisor de um frigorífico paranaense contra uma empregada, condenando a empresa a pagar R$ 132.000,00 à trabalhadora.
O caso ocorreu quando a trabalhadora retornava para casa, depois de perder o transporte fornecido pela empresa por ter trabalhado além do horário, por ordem do próprio supervisor.
O Tribunal reconheceu também os requisitos que justificam a responsabilização civil da empresa, condenada a pagar reparação por danos morais de R$ 132 mil à trabalhadora. Sendo que, depois da violência, a mulher passou a sofrer de estresse pós-traumático e transtorno depressivo. No entendimento dos ministros que integram a Sétima Turma, a empresa foi omissa em apurar a conduta do empregado, acusado de assediar também outras funcionárias.
Em depoimento prestado na Justiça do Trabalho, a empregada contou que era assediada pelo supervisor desde que fora contratada e que relatou o problema a encarregadas do setor em que atuava no frigorífico. Também disse não ter levado o caso ao setor de recursos humanos por receio de ter sua credibilidade questionada, já que o homem falava que seria a palavra dela contra a dele.
Após o episódio, disse ter procurado a equipe de RH da empresa, onde foi aconselhada a não registrar boletim de ocorrência.
Depois da agressão, a mulher não trabalhou mais no frigorífico. Traumatizada e com depressão, ficou afastada por atestado médico. Passou a receber auxílio-doença. E após seu vencimento do benefício, pediu demissão. Perícia médica constatou que ela desenvolveu estresse pós-traumático e transtorno depressivo que, segundo o laudo, tiveram origem “a partir de um trauma importante, uma ameaça à vida”.
A empresa negou a ocorrência de conduta delituosa, alegando que, se houve algum problema entre o supervisor e a empregada, “não foi no horário de trabalho, no ambiente de trabalho ou em razão do trabalho”.
Com base nas provas e depoimentos, a Vara do Trabalho entendeu que a mulher foi vítima de violência sexual inserida no contrato de trabalho. Também considerou a empresa omissa em seu dever de fiscalizar o ambiente profissional e de adotar providências em relação ao empregado denunciado por assédio.
Para o Relator Ministro Agra Belmonte, a violência sexual praticada contra a mulher teve início dentro da empresa, quando o supervisor determinou que a empregada trabalhasse até mais tarde, o que a levou a perder o transporte e ficar mais vulnerável, tudo conforme narrado nos autos.
Assinalou, ainda, que a ausência de processo penal quanto ao estupro não é fato estranho a situações como essa, pois grande parte das vítimas dessa violência tem “verdadeiro pavor em expor a agressão sofrida e enfrentar represálias, o que, no caso dos autos, fica ainda mais palpável, por tratar-se de situação envolvendo superior hierárquico”.
Agra Belmonte destacou que o Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ orienta que, em casos que envolvem assédio e violência sexual no ambiente de trabalho, “os indícios e o depoimento da vítima ganham especial relevância”. Assim, pontuou que o conjunto probatório, incluindo o depoimento pessoal da trabalhadora e das testemunhas constituem “provas indiciária e indireta suficientes para demonstrar o ilícito, bem como o conhecimento deste pela empresa”. Seu voto também foi fundamentado na legislação nacional e em convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Para o relator, o dano sofrido pela mulher (depressão e estresse pós-traumático), a culpa da empregadora e o nexo causal com o trabalho que a empregada desempenhava são requisitos que justificam a responsabilização da empresa e a necessidade de reparação civil.
Portanto, de forma unânime, a Sétima Turma determinou que o frigorífico indenize a trabalhadora em 100 salários-mínimos pelos danos morais (aproximadamente R$ 132 mil) e em R$ 6 mil por danos patrimoniais, conforme limites do pedido inicial.
A sentença também foi restabelecida quanto à declaração de nulidade do pedido de demissão, com o reconhecimento de culpa da empresa (rescisão indireta).
Escrito por Diogo Karl Rodrigues, advogado do Karl Advogados.